RECURSO – Documento:7056230 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 5004151-47.2023.8.24.0074/SC DESPACHO/DECISÃO A. G. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição Federal (evento 20, RECESPEC1). O apelo visa reformar acórdão proferido pela 7ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 13, ACOR2): APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. 1. ADMISSIBILIDADE. SUSCITADA A PRELIMINAR DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PEDIDO INDEFERIDO EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA NÃO IMPUGNADA. ART. 1.015 DO CPC. PEDIDO NÃO CONHECIDO.
(TJSC; Processo nº 5004151-47.2023.8.24.0074; Recurso: RECURSO; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 20 de abril de 2021)
Texto completo da decisão
Documento:7056230 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 5004151-47.2023.8.24.0074/SC
DESPACHO/DECISÃO
A. G. interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição Federal (evento 20, RECESPEC1).
O apelo visa reformar acórdão proferido pela 7ª Câmara de Direito Civil, assim resumido (evento 13, ACOR2):
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR.
1. ADMISSIBILIDADE. SUSCITADA A PRELIMINAR DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PEDIDO INDEFERIDO EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA NÃO IMPUGNADA. ART. 1.015 DO CPC. PEDIDO NÃO CONHECIDO.
2. MÉRITO. PLEITEADA A RESCISÃO CONTRATUAL E RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DO RÉU EM RAZÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO OBJETO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E GRAVAME JUDICIAL. TESE NÃO ACOLHIDA. AUTOR QUE TINHA CIÊNCIA DE QUE O VEÍCULO POSSUÍA ENTRAVES ADMINISTRATIVOS E QUE O VENDEDOR NÃO ERA PROPRIETÁRIO REGISTRAL DO BEM, NÃO POSSUÍA PROCURAÇÃO PARA NEGOCIAR E INFORMOU SOBRE A IMPOSSIBILIDADE DE REGULARIZAÇÃO JUNTO AO DETRAN NO MOMENTO DA TRANSAÇÃO. ACIONANTE QUE ASSUMIU O RISCO EM CONTINUAR COM A NEGOCIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE DEMANDAR PELA EVICÇÃO ESTANDO CIENTE DE QUE O BEM ERA DE TERCEIRO OU LITIGIOSO. RECURSO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
Não houve oposição de embargos de declaração.
Quanto à controvérsia, a parte alega violação aos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; e 186 do Código Civil, no que concerne à responsabilização civil do recorrido pela venda de veículo com restrições não informadas, que culminaram em sua apreensão judicial. Aduz que não tinha conhecimento da alienação fiduciária sobre o bem, apenas de pendências administrativas junto ao Detran/SC, e que, por isso, não assumiu o risco da negociação, sendo indevida a negativa de restituição dos valores pagos.
Cumprida a fase do art. 1.030, caput, do Código de Processo Civil.
É o relatório.
Considerando que a exigência de demonstração da relevância das questões federais, nos termos do art. 105, § 2º, da Constituição Federal, ainda carece de regulamentação, e preenchidos os requisitos extrínsecos, passa-se à análise da admissibilidade recursal.
Quanto à controvérsia, a ascensão do apelo nobre pela alínea "a" do permissivo constitucional encontra óbice nas Súmulas 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça.
Sustenta a parte, em síntese, que "o Recorrente tinha informações que o veículo possuía restrições administrativas junto ao Detran/SC, e não dívidas oriundas de um financiamento no Banco Aymore Crédito, Financiamento e Investimento S.A., que gerou a busca e apreensão do bem, causando um prejuízo de aproximadamente R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Caso tivesse conhecimento que o mesmo estava alienado, jamais teria adquirido o bem, frisa-se, informação esta não repassada pelo recorrido" (evento 20, RECESPEC1).
No entanto, o acolhimento da pretensão recursal exigiria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, bem como a interpretação do instrumento contratual, providências vedadas no âmbito do recurso especial. No caso, a Câmara entendeu pela impossibilidade de responsabilização do recorrido porque o recorrente assumiu o risco de negociar bem com pendências documentais.
Merece destaque o seguinte excerto do acórdão (evento 13, RELVOTO1):
O litígio versa, em suma, a respeito da (im)possibilidade de rescisão do contrato de compra e venda, no qual o acionante atuou como comprador e o réu, o vendedor.
Sobre o tema, o Código Civil estabelece:
Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.
Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.
Ademais, a respeito da evicção, a doutrina explica:
A evicção é a garantia própria dos contratos comutativos que criam a obrigação de transferir o domínio de determinada coisa. Deriva do princípio segundo o qual o alienante tem o dever de garantir ao adquirente a posse justa da coisa transmitida, defendendo-a de pretensões de terceiros quanto ao seu domínio. É um fenômeno próprio de venda de coisa alheia, como diz Mirabelli.
Dá-se evicção quando o adquirente vem a perder a propriedade ou posse da coisa em virtude de sentença judicial que reconhece a outrem direito anterior sobre ela. O vocábulo vem do latim evictio, que significa recuperação judicial de uma coisa. Resguardar os riscos da evicção significa garantir o adquirente contra a perda do domínio por sentença judicial, e, na hipótese de vir ele a perdê-lo, assegurar-lhe a restituição integral do preço mais a indenização dos frutos que tiver sido obrigado a devolver, despesas do contrato, custas judiciais [e honorários advocatícios]. (GOMES, Orlando. Contratos - 28ª Edição 2022. 28. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. E-book. p.129. ISBN 9786559645640.)
Ademais, em seu art. 455, a legislação civilista diz que "se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito a indenização".
Contudo, reforça no seu art. 457 que "Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era alheia ou litigiosa."
Constata-se, nos autos, que é incontroverso que o acionante celebrou, em 20 de abril de 2021, contrato de compra e venda com o réu referente ao veículo Ford/Fiesta, de placas MDI4424, posteriormente alterada para MDI4E24, atuando o primeiro como comprador e o segundo como vendedor (evento 1, CONTR6).
Também é fato incontestável que o automóvel em questão foi apreendido em decorrência de uma dívida em nome de terceiro, Valdir de Liz (evento 1, OUT11 e evento 1, OUT8)
Malgrado o inconformismo da parte autora, vislumbro que a sentença deve ser mantida.
Da análise dos autos, entendo que o autor assumiu o risco ao negociar um bem sobre o qual tinha ciência de pendências documentais.
A respeito, verifico que, na petição inicial, o autor afirmou ter negociado com o réu, tendo em vista que este atuava como revendedor de automóveis usados.
Observo, contudo, que o acionante tinha ciência, ainda na fase de negociação, de que o veículo se encontrava com pendências administrativas junto ao Detran (evento 1, INIC1, p. 3), vide trecho extraído da exordial:
Conforme se verifica no contrato, a posse do bem, fora transferida no momento da assinatura do contrato, todavia, a transferência definitiva ocorreria em alguns dias, haja vista que o Requerido informou ao Requerente que algumas haviam algumas pendências administrativas do veículo junto ao DETRAN/SC.
Nessa linha, embora o vendedor, ora acionado, fosse o responsável contratual pela regularização do veículo (evento 1, CONTR6), vislumbro que o adquirente assumiu o risco de negociar um bem que não pertencia ao vendedor, o qual nem possuía procuração do proprietário registral, ciente, ainda, das pendências administrativas existentes.
Ou seja, o acionante agiu com negligência e, com fulcro no art. 457, não pode pleitear em juízo a rescisão do contrato, considerando que tinha ciência das pendências do veículo. Pelos mesmos fundamentos, não é possível ao autor responsabilizar civilmente o réu pelo ocorrido, uma vez que assumiu o risco ao ter ciência da situação junto ao Detran e, ainda assim, prosseguir com a negociação.
Considerando a fundamentação adotada, o acórdão recorrido somente poderia ser modificado mediante o reexame dos aspectos concretos da causa e do contrato firmado entre as partes.
Ressalte-se que a parte recorrida, em contrarrazões, formulou pedido de majoração dos honorários recursais e aplicação de multa por litigância de má-fé.
Todavia, conforme os §§ 1º e 11 do art. 85 do CPC, a majoração da verba honorária é competência exclusiva do tribunal que julgar o mérito do recurso. O mesmo raciocínio aplica-se ao exame de eventual litigância de má-fé, cuja apreciação também compete à instância superior. Nesse sentido: EDcl nos EDcl no AgInt no RE nos EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.333.920/SP, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, j. em 29-4-2025.
Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, NÃO ADMITO o recurso especial do evento 20.
Intimem-se.
assinado por JANICE GOULART GARCIA UBIALLI, 3° Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7056230v5 e do código CRC 1964b6e9.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JANICE GOULART GARCIA UBIALLI
Data e Hora: 12/11/2025, às 13:56:39
5004151-47.2023.8.24.0074 7056230 .V5
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:07:42.
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